
DOENÇA
A malasseziose é uma enfermidade comumente observada em clínicas médicas de pequenos animais, sendo até o presente momento, a espécie M. pachydermatis (Malassezia pachydermatis) o agente mais estudado nas otites e dermatites causadas por este gênero de leveduras. (ROSA et al., 2004)
Por décadas, o gênero Malassezia foi limitado a duas espécies, sendo uma lipo-dependente e outra não, respectivamente por M. furfur e M. pachydermatis, (ROSA et al., 2004). Em 1994, estudos genotípicos de diversas cepas, associados às características fenotípicas, permitiram a identificação de sete espécies, denominadas: M. furfur, M. pachydermatis, M. sympodialis, M. slooffiae, M. restricta, M. globosa e M. obtusa. Essas leveduras utilizam lipídios como fonte de carbono (lipofílicas) e necessitam da suplementação com ácidos graxos de cadeia longa para o crescimento in vitro, sendo assim, denominadas leveduras lipo-dependentes, com exceção da M. pachydermatis, cuja suplementação é desnecessária, já que se trata da única espécie do gênero não-lipodependente. (COUTINHO, 1997 e NAHAS, 1997).
Esta levedura encontra-se normalmente em pequenas quantidades nos condutos auriculares externos, sacos anais, no reto, na vagina e dobras cutâneas úmidas. (MELO et al., 2001 e SANTIN et al, 2008). De acordo com o artigo de Santin et al. (2008), foi constatada a presença de M. pachydermatis na cavidade oral, comprovando que esta levedura também faz parte da microbiota bucal de cães, bem como está presente no biofilme dental.
Por ser frequentemente isolado no conduto auditivo de cães com otite externa e na pele de animais com dermatoses pruriginosas, tem sido considerado um importante invasor secundário e patogênico, sendo que algumas condições e fatores predisponentes podem conduzir a sua evolução exacerbada, causando a doença, como no caso uma reação de hipersensibilidade ao fungo ou no caso de seu crescimento cutâneo excessivo. (COUTINHO, 2005 e SANTIN et al., 2008).
Uma proliferação exagerada está quase sempre associada a uma causa primária como:
a) dermatopatias alérgicas (principalmente atopia e alergia alimentar) - As dermatopatias alérgicas, incluindo hipersensibilidade, estimulam a hiperplasia das glândulas sebáceas da derme, favorecendo a multiplicação da Malassezia sp. (NAHAS,1997)
b) endocrinopatias (hipotireoidismo, hiperadrenocorticismo, diabete mellitus) - Os hormônios influenciam nas concentrações de ácidos graxos séricos e cutâneos, sendo assim, as mudanças seborréicas são comuns em cães
c) distúrbios de ceratinização (seborréia canina) - Devido ao seu supercrescimento e ligação aos queratinócitos, continua a estimular mudanças e proliferações seborréicas piorando as condições da pele gordurosa causando intensos pruridos e inflamação (SCOTT et al. 2001 e GROSS et al. 2005).
d) Acantose Nigricante - é um raro padrão de reação cutânea ocasionada ou por tipos primários (idiopáticos) ou secundários (anormalidades conformacionais, obesidade, endocrinopatias e hipersensibilidade), caracterizandose por hiperpigmentação axilar, liquenificação e alopecia. Devido às modificações seborréicas, ocorre malasseziose secundária agravando assim as manifestações inclusive o prurido. (SCOTT et al., 2001).
e) Dermatoses responsivas a Zinco - Segundo o relato de caso de Melo et al. (2001), a baixa qualidade da ração fornecida aos animais podem gerar deficiência de zinco podendo desempenhar um importante papel como fator predisponente à esta malasseziose.
f) Doenças dermatológicas parasitárias e bacterianas
g) Doenças com imunossupressão (imunodeficiencia felina, leucemia felina, imunossupressão induzida por antibioterapia e/ou corticoterapia)
TRATAMENTO
Para o tratamento contra malasseziose é importante a identificação e controle de quaisquer causas primárias e eventuais fatores predisponentes que possam levar ao supercrescimento da levedura, tendo como objetivo sua redução e eliminação dos sinais. (SCOTT et al., 2001; GUILLOT; 2003). Se as causas predisponentes não puderem ser encontradas e corrigidas, é necessária a manutenção crônica do tratamento, devendo ser feito com medicamentos tópicos semanais ou administração sistêmica uma ou duas vezes por semana. (WILLENSE, 2002)
a) Tratamento sistêmico
Os principais anti-fúngicos sistémicos são o cetoconazol e o itraconazol e são utilizados principalmente quando a OE é grave, quando existe estenose do canal auditivo ou otite média concomitante (Scott, Miller & Griffin, 2001a). O tratamento sistémico é incontornável se houver otite média, já que é a única maneira de atingir concentrações terapêuticas no ouvido médio (Morris, 2006). O cetoconazol é prescrito na dose de 5 a 10 mg/kg, PO, SID durante 21 a 30 dias (Chen & Hill, 2005). Os efeitos adversos do cetoconazol podem ser graves e incluem anorexia, vómitos, diarreia, hepatotoxicidade ou ainda trombocitopenia (Morris, 2006). A alternativa, que é recomendada actualmente, é então o itraconazol, que pode ser administrado na dose de 5 mg/kg, SID, PO durante 21 dias (Chen & Hill, 2005). Um estudo relata que a administração pulsátil (administração intermitente de um fármaco na mesma dose mas com intervalo maior entre doses) do itraconazol, 2 dias consecutivos por semana durante 3 semanas, tem o mesmo efeito que a administração diária durante os 21 dias (Pinchbeck et al., 2002). O itraconazol é um antifúngico triazólico lipofílico aprovado no tratamento de doenças fúngicas cutâneas e sistémicas no Homem (Candida spp, Malassezia spp); tem propriedades queratinofílicas e lipofílicas que resultam na sua retenção na pele; as concentrações pico na pele chegam a ser 5-10 vezes maiores que no plasma e mantêm-se altas até 7 dias após descontinuação do tratamento; tem melhor penetração tecidual, maior meia-vida de eliminação e menor toxicidade que cetoconazol (Pinchbeck et al., 2002). Estas características é que possibilitam a administração pulsátil, que tem benefícios: menos efeitos adversos, maior colaboração do proprietário, redução do custo do tratamento (Pinchbeck et al., 2002). Há menor risco de reacções adversas com o itraconazol do que com o cetoconazol, no entanto, pode ocorrer anorexia (talvez devido a toxicose hepática) e também vasculite (dermatite ulcerativa) (Pinchbeck et al., 2002; Morris, 2006).
Também há antifúngicos já usados em medicina veterinária para o tratamento das dermatofitoses, potencialmente capazes de serem usados em casos de malasseziose como o fluconazol (2,5-10mg/kg com intervalos de 24 horas via oral), terbinafina (30mg/kg com intervalos de 24 horas via oral) e o lufenuron. (FRANK & PATTERSON, 2002 e LÓPES, 2008). Guillot et al. (2003) afirmam que ainda haja necessidade de investigação sobre as dosagens, a eficácia e a toxicidade desses fármacos.
Para tratamento em casos de dermatite atópica com redução dos níveis séricos de zinco, Scott et al. (1996) e Melo et al. (2001) relatam que além do uso do cetoconazol, uma fonte de suplementação de zinco deve ser receitada devido sua redução no soro do animal. Este último autor enfatiza que a administração oral de 10ml diários de óleo de girassol, que é rico em acido linoléico (ômega) desempenha importante papel na manutenção da pele e do pêlo, controlando a perda de água transepidérmica, além de regular a magnitude da resposta inflamatória e a proliferação epidérmica em cães seborréicos, e também é recomendado como tratamento adjuvante em dermatopatias.
Tratamento tópico
Agentes tópicos úteis contra as infecções incluem xampus, cremes, loções e sprays a base de cetoconazol a 2%, miconazol a 2%, clotrimazol,ciclopirox olamina 1%, clorexidina 2 a 4%, sulfeto de selênio a 1% e nistatina. (MELO et al., 2001; WILLENSE, 2002; CAMPBELL & MATOUSEK, 2002; MEDLEAU & HNILIKA, 2003 e LÓPES, 2008). Os xampus devem ser aplicados duas vezes por semana até que resulte na cura das manifestações clínicas. (WILLENSE, 2002 e RHODES, 2005).
No tratamento tópico também podem ser empregados agentes ceratolíticos na forma de loções, xampus ou sabonetes como hipossulfeto de sódio, sulfeto de selênio e ácido salicílico (FRANK & PATTERSON, 2002).
No mercado um dos tratamentos antifúngicos mais usados consiste na associação de fármacos que contenham em sua fórmula clorexidina 2% e miconazol 2% (FRANK E PATTERSON, 2002 e CAMPBELL & MATOUSEK, 2002).
CICLOPIROX OLAMINA
Ciclopirox olamina vem ganhando importância principalmente no tratamento de Malassezia sp, dermatite seborréica e Candida cutânea. (droga de escolha).
É um fungicida de amplo espectro para uso tópico, com alto poder de penetração. É altamente eficaz contra praticamente todos os agentes patogênicos causadores de micoses cutâneas superficiais. Possui atividade fungicida "in vitro" contra Trichophyton rubrum, Trichophyton mentagrophytes, Epidermophyton floccosum, Microsporum canis, Candida albicans, Malassezia furfur e M. Pachydermatis.. Além disso, apresenta efeitos antiflogísticos e antibacterianos concomitantes sobre patógenos gram-positivos e gram-negativos